Cláusula rebus sic stantibus

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Conceito e histórico

A cláusula rebus sic stantibus é um instituto que diz que os contratos devem ser executados em consonância com as condições econômicas do tempo da celebração, ou seja, caso ocorra uma alteração que torne a prestação excessivamente gravosa para uma das partes, é possível a extinção do instrumento contratual.

De acordo com Geraldo Serrano Neves, o instituto é de “criação canonista, embora romanos a ela se referissem claramente, a “latinamente bruta, mas conceituadamente enérgica” cláusula rebus sic stantibus, teve origem no princípio de moral cristã que considerava injusto o lucro de alguém derivado da mudança ulterior das circunstâncias sob o império das quais as obrigações foram estipuladas.

De acordo com a doutrina, presume-se nos contratos comutativos, de trato sucessivo e de execução diferida, a existência implícita de uma cláusula, pela qual a obrigatoriedade de seu cumprimento pressupõe a inalterabilidade da situação de fato. Entretanto, esta cláusula era ignorada no auge do liberalismo, já que predominava o princípio da força obrigatória dos contratos: “pacta sunt servanda”. Assim, uma vez pactuado, as partes deveriam cumprir o contrato como se fosse uma lei.

Cláusula rebus sic stantibus e teoria da imprevisão

A partir do século XX, a teoria da imprevisão procurou resgatar os preceitos da referida cláusula.

A diferença entre estes dois institutos é que a teoria da imprevisão pressupõe que as partes do contrato não previram situações capazes de modificar as condições inicialmente pactuadas. Já a cláusula rebus sic stantibus é utilizada na hipótese de as partes confiarem firmemente que as condições permaneceriam as mesmas do início ao fim do contrato.

Ambas, porém, se apresentam como solução em casos de mudanças fáticas indesejadas que comprometem o cumprimento do que fora pactuado.

Ao disciplinar a excessiva onerosidade superveniente, o legislador procurou dar resposta ao problema da alteração das circunstâncias. Quer se explique a resolução do contrato por se considerar subentendida a cláusula rebus sic stantibus, quer pela teoria da imprevisão, ou da base do negócio, a verdade é que, no direito contemporâneo, a alteração radical das condições econômicas dentro das quais o contrato foi celebrado tem sido considerada uma das causas que, com o concurso de outras circunstâncias, podem determinar a sua resolução ou revisão.

Contrato excessivamente oneroso

O contrato será considerado excessivamente oneroso a partir do momento em que causar um desequilíbrio economicamente insuportável para um dos contraentes. É uma espécie de cláusula aberta. Neste caso, o magistrado deverá utilizar a discricionariedade para decidir o caso concreto.

Solução da situação de desequilíbrio

A solução dessa situação passa pela resolução ou pela modificação do contrato.

O Código Civil prevê o seguinte:

Art. 478. Nos contratos de execução continuada ou diferida, se a prestação de uma das partes se tornar excessivamente onerosa, com extrema vantagem para a outra, em virtude de acontecimentos extraordinários e imprevisíveis, poderá o devedor pedir a resolução do contrato. Os efeitos da sentença que a decretar retroagirão à data da citação.

Entretanto, apesar de o artigo mencionar apenas a possibilidade de resolução, o Enunciado 176 da III Jornada de Direito Civil diz o seguinte:

Em atenção ao princípio da conservação dos negócios jurídicos, o art. 478 do Código Civil de 2002 deverá conduzir, sempre que possível, à revisão judicial dos contratos e não à resolução contratual.

Além disso, tem-se o Enunciado 365, da IV Jornada de Direito Civil:

A extrema vantagem do art. 478 deve ser interpretada como elemento acidental da alteração de circunstâncias, que comporta a incidência da resolução ou revisão do negócio por onerosidade excessiva, independentemente de sua demonstração plena.

Código de Defesa do Consumidor

O Código de Defesa do Consumidor não faz referência a acontecimento imprevisível, exigindo apenas que os fatos sejam supervenientes:

Art. 6º São direitos básicos do consumidor: V – a modificação das cláusulas contratuais que estabeleçam prestações desproporcionais ou sua revisão em razão de fatos supervenientes que as tomem excessivamente onerosas;

Jurisprudência

Caso 1

SUBMISSÃO À CLÁUSULA REBUS SIC STANTIBUS. INEXISTÊNCIA DE OFENSA À GARANTIA DA COISA JULGADA. PRECEDENTES. 1. No julgamento do RE 596.663-RG, Rel. Min. Marco Aurélio, Rel. para o Acórdão Min. Teori Zavascki, DJe 26.11.2014, o Tribunal reconheceu que o provimento jurisdicional, ao pronunciar juízos de certeza sobre a existência, a inexistência ou o modo de ser das relações jurídicas, a sentença leva em consideração as circunstâncias de fato e de direito que se apresentam no momento da sua prolação. 2. Tratando-se de relação jurídica de trato continuado, a eficácia temporal da sentença permanece enquanto se mantiverem inalterados esses pressupostos fáticos e jurídicos que lhe serviram de suporte (cláusula rebus sic stantibus). 3. Inexiste ofensa à coisa julgada na decisão do Tribunal de Contas da União que determina a glosa de parcela incorporada aos proventos por decisão judicial, se, após o provimento, há alteração dos pressupostos fáticos e jurídicos que lhe deram suporte. 4. Ordem denegada.

Caso 2

CLÁUSULA “REBUS SIC STANTIBUS”. PRECEDENTE DA CORTE ESPECIAL DO STJ. 1. Entende o STJ que “‘as diferenças remuneratórias decorrentes da conversão dos proventos dos servidores em URV, embora não possam ser compensadas com reajustes posteriores, ficam limitadas no tempo quando houver ocorrido a reestruturação da carreira, com a instituição de um novo regime jurídico remuneratário’. Precedentes: AgRg no REsp 1.333.769/MG, Rel. Ministra Eliana Calmon, Segunda Turma, ale 29/11/2013; AgRg no REsp 1.302.854/MG, Rel. Ministro Arnaldo Esteves Lima, Primeira Turma, DJe 10/5/2013; AgRg no AREsp 294.130/MG, Rel. Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, ale 29/4/2013; AgRg no AREsp 199.224/MG, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe 24/10/2012′ (STJ, AgRg no REsp 1.320.532/MG, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma, DJe de 16/5/2014).” (AREsp 1196439/SP, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 28/11/2017, DJe 19/12/2017). 2. A Corte Especial, no julgamento do MS 11.045/DF, dispôs que a força da coisa julgada tem uma condição implícita: a da cláusula rebus sic stantibus, a significar que ela atua enquanto se mantiverem íntegras as situações de fato e de direito existentes quando da prolação da sentença. 3. Agravo interno não provido.

Caso 3

MEDIDA REVESTIDA DA CLÁUSULA REBUS SIC STANTIBUS. ORDEM DENEGADA. DECISÃO POR MAIORIA. A Decisão que converte a prisão em flagrante em custódia preventiva deve estar devidamente motivada. O melhor entendimento doutrinário segue a linha de que a prisão cautelar deve estar obrigatoriamente comprometida com a instrumentalização do processo criminal. O porte de droga no interior de Instituição de Ensino, com sinais indicativos de finalidade mercantil, mormente pela quantidade aferida e pela reiteração da prática, possui, de per si, o condão de malferir os preceitos da hierarquia e da disciplina militares. Os pais que optam pelos Colégios Militares acreditam nos valores que o orientam e desejam que seus filhos absorvam a cultura, as tradições, o modo de fazer e de agir, como ministrado em sua formação educacional, num ambiente voltado para desígnios construtivos. Demonstra-se exposto o periculum libertatis do Paciente, na medida em que se encontram presentes o trinômio: gravidade da infração, repercussão social e periculosidade do agente. A liberdade precoce daquele que porta drogas em local de extrema sensibilidade para o corpo social colocará em xeque a própria credibilidade do Judiciário. O art. 254 do CPPM possui cláusula implícita rebus sic stantibus, porquanto prevê que a medida cautelar se justificará quando estiverem presentes o fumus commissi delicti e o periculum libertatis, e deve ser mantida enquanto persistir a sua necessidade. Writ conhecido e denegado. Decisão por maioria.

MAPA MENTAL – RESUMO

Cláusula rebus sic stantibus - mapa mental

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REFERÊNCIAS

FARIAS, Cristiano Chaves de. Direito civil: contratos: Curso de direito civil: contratos – teoria geral e contratos em espécie. 5. ed. São Paulo: Atlas, 2015.

GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil esquematizado, volume I. São Paulo: Saraiva, 2011.

MELLO, Cleyson de Moraes. Direito civil: contratos. 2. ed. Rio de Janeiro: Freitas Bastos Editora, 2017.


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