Tempo de leitura: 17 minutos
Conceito
Negócio jurídico é todo fato jurídico consistente em uma declaração de vontade à qual o ordenamento jurídico atribuirá os efeitos designados como desejados, desde que sejam respeitados os pressupostos de existência, os requisitos de validade e os fatores de eficácia.
O Professor Caio Mário da Silva Pereira o define como “toda declaração de vontade, emitida de acordo com o ordenamento legal, e geradora de efeitos jurídicos pretendidos”.
Segue um mapa mental com os principais pontos que serão abordados:
Classificação
Quanto às vontades patrimoniais
Gratuitos: apenas uma das partes é beneficiada, não havendo contraprestação.
Exemplos: Doação; Comodato; Renúncia de Posse; etc.
Onerosos (sinalagmáticos): situações em que ambas as partes obtêm vantagem, existindo contraprestações.
Exemplos: Contrato de Compra e Venda; Contrato de Trabalho; Consórcios etc.
Os negócios jurídicos onerosos podem ser:
COMUTATIVOS |
Quando há equilíbrio e proporcionalidade nas prestações. Exemplos: Compra e Venda; Locação; Financiamento etc. |
ALEATÓRIOS |
Dependem de um acontecimento para que haja a contraprestação. Exemplos: Contrato de seguro; Contrato de plano de Saúde; Assistência Funeral etc. |
Neutros: não são onerosos nem gratuitos, mas livres de atribuição patrimonial.
Exemplos: Cláusula de Incomunicabilidade; Instituição de bem de família.
Bifrontes: podem ser tanto gratuitos quanto onerosos.
Exemplos: Contrato de Depósito (pode ser gratuito ou oneroso) e Doação (pode ser pura ou mediante pagamento); etc.
Quanto ao número de declarantes
Unilaterais: apenas uma manifestação de vontade, em busca da mesma finalidade.
Exemplos: Promessa de Recompensa; Testamento; Notificação extrajudicial etc.
Bilaterais: manifestação de vontade de duas partes.
Exemplos: Contrato de Compra e Venda; Contrato de Locação, Contato de Financiamento etc.
Plurilaterais: negócios jurídicos em que é necessária a manifestação de mais de duas vontades para a mesma finalidade, porém em sentidos contrários.
Exemplos: Contrato de Seguro Coletivo Empresarial; Contrato de Sociedade etc.
Quanto à forma
Formais ou Solenes: são aqueles negócios jurídicos que exigem uma forma especial prevista em lei.
Exemplos: casamento; cheque; escritura pública de compra e venda etc.
Não Formais ou Não Solenes: a forma do negócio jurídico fica à disposição das partes.
Exemplos: Recibos; Notificação Extrajudicial; Venda de bens móveis etc.
Quanto ao momento de produção de efeitos
Inter vivos: produzem efeitos enquanto as partes estão vivas (venda e compra, troca);
Causa mortis: produzem efeitos após a morte da pessoa como, por exemplo, o testamento.
Quanto à existência
Principais: existem por si mesmos. A sua existência não está vinculada a outro negócio jurídico.
Exemplos: Contrato de Locação; Prestação de Serviços etc.
Acessórios: somente existem em razão do negócio jurídico principal.
Exemplos: Garantia em um contrato de compra e venda; fiança na locação; multa em contrato de prestação de serviços etc.
Disposições Gerais do Código Civil
- A incapacidade relativa de uma das partes não pode ser invocada pela outra em benefício próprio, nem aproveita aos cointeressados capazes, salvo se, neste caso, for indivisível o objeto do direito ou da obrigação comum.
- A impossibilidade inicial do objeto não invalida o negócio jurídico se for relativa, ou se cessar antes de realizada a condição a que ele estiver subordinado – Ex: é impossível vender um bezerro que não nasceu, mas assim que nascer poderei fazê-lo (essa impossibilidade não invalida o contrato de compra e venda).
- A validade da declaração de vontade não dependerá de forma especial, SALVO quando a lei expressamente a exigir.
- Não dispondo a lei em contrário, a escritura pública é essencial à validade dos negócios jurídicos que visem à constituição, transferência, modificação ou renúncia de direitos reais sobre imóveis de valor superior a 30 salários-mínimos.
- A manifestação de vontade subsiste ainda que o seu autor haja feito a reserva mental de não querer o que manifestou, salvo se dela o destinatário tinha conhecimento – Reserva mental: quando a vontade declarada não coincide com a real, com o fim de enganar o destinatário (é diferente de simulação, que pressupõe conluio).
- O silêncio importa anuência, quando as circunstâncias ou usos o autorizarem, e não for necessária a declaração de vontade expressa.
- Nas declarações de vontade se atenderá mais à intenção do que ao sentido literal.
- Os negócios jurídicos devem ser interpretados conforme a boa-fé e os usos do lugar de sua celebração.
- Os negócios jurídicos benéficos (gratuitos) e a renúncia interpretam-se estritamente.
Lei da Liberdade Econômica
LEI Nº 13.874 DE 2019 (LEI DA LIBERDADE ECONÔMICA) |
A interpretação do negócio jurídico deve lhe atribuir o sentido que:
Corresponder a qual seria a razoável negociação das partes sobre a questão discutida, inferida das demais disposições do negócio e da racionalidade econômica das partes, consideradas as informações disponíveis no momento de sua celebração. |
As partes poderão livremente pactuar regras de interpretação, de preenchimento de lacunas e de integração dos negócios jurídicos diversas daquelas previstas em lei. |
Da representação
Definição
Os direitos adquirem-se por ato próprio do adquirente ou por intermédio de outrem. Neste último caso surge o fenômeno da representação. A manifestação de vontade pelo representante, nos limites de seus poderes, produz efeitos em relação ao representado.
Espécies
- Legal: deferida pela lei aos pais, tutores, curadores. É exercida atribuindo a alguém a função de cuidar dos interesses de pessoas incapazes.
- Judicial: ocorre em relação à pessoa capaz, instituída pelo juiz, como o síndico em relação à massa falida, o inventariante em relação ao espólio de bens
- Convencional ou Voluntária: decorre do negócio jurídico específico denominado “mandato”.
Conflito de interesses
Desde que haja má-fé por parte do representante e do outro contratante, ou seja, desde que este saiba previamente (ou deva saber) do conflito, poderá ser anulado o negócio jurídico pelo representado.
Contrato consigo mesmo
A lei denomina “contrato consigo mesmo” a hipótese em que a pessoa atua como representante de um lado e parte de outro. Aliena (como representante) um bem ou direito a si mesmo (mas aqui como o outro polo contratante). Para esse negócio a regra é a proibição, salvo se permitido pela lei ou pelo próprio representado.
Planos do negócio jurídico
A exteriorização para o mundo jurídico da manifestação da vontade deve ser analisada sob três aspectos, chamados de planos do negócio jurídico, os quais são determinantes para a produção de seus efeitos jurídicos.
São eles: o plano da existência, o plano da validade e o plano da eficácia.
Plano da existência
Para que um negócio jurídico tenha existência é necessário verificar o elemento subjetivo (partes), o elemento objetivo (a existência de uma objeto) e a finalidade negocial (a manifestação da vontade em torno de um objeto).
Nas lições de Pontes de Miranda, o negócio jurídico inexistente não é nulo nem ineficaz, uma vez que sequer ingressou no mundo jurídico.
Plano da validade
O plano de validade é o segundo elemento essencial do negócio jurídico. É um requisito que, se ausente, torna o negócio jurídico inválido.
Para que o negócio jurídico seja válido, conforme o art. 104 do Código Civil, é necessário:
- Agente capaz.
- Objeto lícito, possível, determinado ou determinável.
- Forma prescrita ou não defesa em lei.
Agente capaz
É agente capaz para celebrar negócio jurídico todo aquele que tem a plenitude da capacidade civil. Todavia, a ausência de capacidade de exercício de direitos e contrair obrigação não impede que, por meios legais, se possa celebrar negócios jurídicos.
Nesse sentido, a pessoa absolutamente incapaz para o exercício dos atos da vida civil pode celebrar negócio jurídico, desde que esteja devidamente representada.
Já as pessoas relativamente incapazes, embora possam manifestar a vontade em celebrar negócios jurídicos, devem ser assistidas por quem detenha a plenitude da capacidade civil, sob pena de se tornar anulável o negócio jurídico.
Objeto lícito, possível, determinado ou determinável
A licitude significa dizer não ser proibido pelo direito e pela moral.
A possibilidade, por sua vez, refere-se à existência física ou jurídica do objeto.
A determinação se observa com a própria existência desses elementos que caracterizam o objeto. Todavia, se o objeto não for determinado, deve ao menos ser determinável, ou seja, ter uma expectativa de determinação futura.
Forma prescrita ou não defesa em lei
Apesar da liberdade das formas, há casos previstos em lei em que há uma imposição de que a manifestação da vontade seja efetuada de uma determinada forma.
Com efeito, verifica-se, assim, que a regra é a liberdade das formas e o formalismo torna-se exceção, uma vez que somente quando a lei exigir determinada forma é que esta deverá ser observada, no mais, há liberdade das formas.
Plano da eficácia
O plano da eficácia cuida dos elementos acidentais do negócio jurídico. São cláusulas que podem ou não existir no negócio jurídico. As partes podem inserir ou não determinações acessórias que modificam os efeitos jurídicos do negócio e dependem de acontecimentos externos que decorrem de condição, termo e encargo.
- Condição: é uma cláusula acessória do negócio que tem origem exclusivamente na vontade das partes e subordina o efeito do pacto a um acontecimento futuro e incerto.
- Termo: é uma situação que subordina a eficácia do negócio jurídico a um fato futuro e certo.
- Modo ou encargo: é uma cláusula acessória que determina um ônus àquele que é contemplado por um determinado ato.
Resumindo…
Escada Ponteana (Pontes de Miranda):
Invalidade
A falta de um dos três elementos que compõem o plano de validade, ditos elementos essenciais, é causa de nulidade. É uma sanção imposta pelo direito em razão da privação de efeitos jurídicos do negócio praticado em desconformidade com a norma.
A nulidade pode ser:
a) absoluta (nulidade): decorre da não observância dos elementos essenciais ao negócio jurídico. O ato é totalmente nulo, dele nada pode ser aproveitado ou ratificado, e, por ferir norma de ordem pública, pode ser declarado por iniciativa do juiz. O efeito da declaração de nulidade nesse caso é ex tunc, ou seja, a declaração da nulidade retroage à data da celebração do negócio, não produzindo este qualquer efeito.
b) relativa (anulabilidade): o ato é anulável e, enquanto não for declarado como tal pelo juiz, produz seus efeitos normalmente. Nesse caso, a lei oferece a alternativa às partes de ou deixar o negócio como está, mesmo viciado, ou requerer a anulação, deixando o ato de produzir seus efeitos a partir da data da declaração da anulabilidade, ou seja, ex nunc.
Nulidade
É a sanção legal para os atos praticados sem os necessários requisitos, do que resulta a inidoneidade do ato para a produção dos efeitos que lhe são próprios.
O negócio jurídico nulo não é suscetível de confirmação, nem convalesce pelo decurso do tempo.
Hipóteses de nulidade:
- Celebrado por pessoa absolutamente incapaz;
- For ilícito, impossível ou indeterminável o seu objeto;
- O motivo determinante, comum a ambas as partes, for ilícito;
- Não revestir a forma prescrita em lei;
- For preterida alguma solenidade que a lei considere essencial para a sua validade;
- Tiver por objetivo fraudar lei imperativa;
- A lei taxativamente o declarar nulo, ou proibir-lhe a prática, sem cominar sanção;
- Negócio simulado.
Conversão substancial do negócio jurídico: se o negócio jurídico nulo contiver os requisitos de outro, subsistirá este quando o fim a que visavam as partes permitir supor que o teriam querido, se houvessem previsto a nulidade.
Anulabilidade
É uma sanção mais branda que a nulidade.
Sua razão de ser está na proteção que o direito dispensa aos interesses particulares.
Por isso, o negócio anulável pode ser confirmado pelas partes, salvo direito de terceiro, sendo que o ato de confirmação deve conter a substância do negócio celebrado e a vontade expressa de mantê-lo.
Hipóteses de anulabilidade (além dos casos expressamente declarados na lei):
- Por incapacidade relativa do agente;
- Por vício resultante de erro, dolo, coação, estado de perigo, lesão ou fraude contra credores.
ATENÇÃO! |
O menor, entre 16 e 18 anos, não pode, para eximir-se de uma obrigação, invocar a sua idade, se dolosamente a ocultou quando inquirido pela outra parte, ou se, no ato de obrigar-se, declarou-se maior. Ninguém pode reclamar o que, por uma obrigação anulada, pagou a um incapaz, se não provar que reverteu em proveito dele a importância paga. |
Anulabilidade x Nulidade
ANULABILIDADE | NULIDADE |
Interesse privado (mera conveniência das partes). | Interesse público (ordem pública). |
Negócios realizados por pessoa relativamente incapaz ou eivados de algum vício do consentimento ou vício social. | Negócios realizados sem observância dos requisitos essenciais ou quando ofendem preceitos de ordem pública, que interessam à sociedade. |
Depende da provocação dos interessados diretamente prejudicados. | Alegada por qualquer interessado em nome próprio ou por intermédio do MP. |
Pode ser suprida pelo juiz, a requerimento das partes ou sanada pela confirmação. | Não pode ser suprida pelo juiz ou sanada pela confirmação. |
Se a lei não estabelecer outro prazo, será de dois anos para pleitear-se a anulação. | Não se valida com o decurso do tempo. |
|
Imprescritível. |
A lei estabelecerá uma série de regras para que o juiz possa, diante do caso concreto, ao verificar o não atendimento de um requisito de validade, evitar a aplicação da sanção de invalidade, preservando-se assim a vontade declarada.
Hipóteses:
Confirmação ou ratificação: após a prática do negócio com uma causa de anulabilidade, a parte ou o seu assistente, de maneira expressa ou tácita, podem manifestar concordância com aquilo que foi praticado.
Redução: há declaração de nulidade apenas da cláusula que tiver maculada, ocorrendo então uma declaração parcial de invalidade do negócio.
Revisão: normalmente, a revisão terá lugar quando as prestações estabelecidas forem desproporcionais. Tais cláusulas serão alteradas para que o negócio se mantenha, preservando assim o equilíbrio das prestações.
Conversão substancial: a lei permite que ele possa recategorizar o negócio jurídico a fim de que a vontade manifestada venha a se amoldar à exigência legal.
Vícios do negócio jurídico
Os defeitos do negócio jurídico, que estão no plano da validade (gerando nulidade ou anulabilidade) serão estudados em um tópico próprio.
Efeitos do Negócio Jurídico
Conceito
Todo negócio jurídico válido irradia efeitos. Entretanto, em razão da autonomia da vontade, esses efeitos (eficácia) podem ser modificados pela inserção de elementos acidentais no negócio. São eles: a condição; o termo; e o modo ou encargo.
Condição
Considera-se condição a cláusula que, derivando exclusivamente da vontade das partes, subordina o efeito do negócio jurídico a evento futuro e incerto.
A subordinação acarreta ora a suspensão (condição suspensiva) ora a resolução, ou seja, extinção (condição resolutiva) da eficácia negocial.
CONDIÇÃO SUSPENSIVA |
Enquanto não se verificar, não se terá adquirido o direito a que ele visa. Trata-se apenas de um direito eventual, ou seja, uma expectativa de direito. |
CONDIÇÃO RESOLUTIVA |
Enquanto não se realizar, vigorará o negócio jurídico, podendo exercer-se desde a conclusão deste o direito por ele estabelecido. Sobrevindo a condição resolutiva, extingue-se, para todos os efeitos, o direito a que ela se opõe. |
Termo
É o momento em que começa ou se extingue a eficácia de um ato jurídico.
Enquanto a condição é acontecimento futuro e incerto, o termo é futuro e certo.
O Código Civil estabelece duas espécies de termo:
Termo inicial ou suspensivo: o termo inicial é o que fixa o momento em que a eficácia do negócio deve ter início. O fato de haver termo não significa que a parte ainda não adquiriu o direito, pelo contrário: já houve a aquisição, mas o exercício é diferido. Isto porque o “termo” é evento futuro, mas é certo.
Termo final ou resolutivo: o termo final extingue o direito. Fixa o momento de resolução do negócio.
OBSERVAÇÕES |
|
Encargo ou modo
É um ônus imposto a uma liberalidade.
Serve para impor uma obrigação ao favorecido, em benefício do instituidor ou de terceiros (pode ser a coletividade, inclusive).
Ex.: pessoa que doa determinada quantia para que o beneficiário construa um hospital.
Resumindo…
LEIA MAIS:
⇒ Resumo de Direito Administrativo
⇒ Resumo de Direito Constitucional
⇒ Resumo de Direito Processual Civil